quarta-feira, 16 de junho de 2010

Artigo - Diabos coletivos

Confesso que ando sem inspiração ou ao menos sem algo na cachola que possa destoar da mesmice destes dias de Copa do Mundo. Não que eu seja contra a alegria coletiva, é justamente o contrário, sou contra a histeria coletiva, pois ela tem levado historicamente o mundo a encruzilhadas de tristezas.

Revolto-me com as nulidades, tidas como sábios personificados nos comentaristas, mesmo que nunca tenha me insurgido contra a poderosa mídia, pois sei o tamanho do calibre, mas não dá mais para assistir tanta asneira. Isso mesmo, pois só um asno absolutamente burro pode sair com pérolas como tenho ouvido e assistido.

O problema central não é o esporte bretão, mas os usos que lhes dão. Tal qual os militares usaram a seleção de setenta para mascararem sua horrenda ditadura, alguns agora o fazem para externar seus ódios e preconceitos.

Para não ser injusto, pois toda generalização é inaceitável, refiro-me a Diogo Mainardi, por ora comentarista da Jovem Pan e do canal GNT, usando e abusando da personificação do mal contra o time norte coreano, como se os jogadores e a comissão técnica fossem responsáveis pelo regime lá instalado.

O sujeito chegou a ponto de pretender que o Brasil fizesse quarenta e seis gols, por ser a conta do número de sul coreanos mortos pelo ataque ao navio daquele país. E por que não fez a mesma ilação quanto ao time americano e aos inocentes que matam a cada dia no Iraque, ou em outras partes do mundo?

Pior. Ao misturar o conflito árabe-israelense no canal GNT, disse que o erro de Israel foi de não ter ainda soltado uma bomba no Irã, talvez em referência às armas atômicas que Israel possui.

O que não podemos aceitar é esta mistura, que ora ridiculariza pessoas ou partidos políticos, ora discrimina povos, ora incendeia ódios. O esporte é muito mais nobre que isso. O esporte é o momento de congraçamento entre os povos, de superação e de beleza, mesmo que nos ingênuos dribles das pernas tortas de um Garrincha, ou no voar acrobático de um Leônidas, na dor de Rumeninge, quando jogou com seu braço enfaixado, nas danças para lá de exóticas dos dias atuais.

Futebol é isso, cada qual sendo um técnico, um sonhador a chutar a cadeira a cada gol perdido. É agüentar o sarro diante da derrota e vergar orgulhosamente a camisa após as vitórias. Talvez por ser como a roda viva da vida, de surpresas e alegrias, do impensável materializar-se, é que reside o encanto.

Portanto, comentaristas deveriam ao menos guardar seus ódios e frustrações para outros momentos, pois o futebol é uma das poucas coisas que aproximam todos os continentes e raças. Que guardem seus diabos para outras ocasiões. Não queiram coletivizá-los.

Luis Carlos Romazzini

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