O diabo foi registrado no cartório do pessimismo. Esta é a minha visão sobre aqueles para os quais o fim dos tempos chega a cada dia, a cada problema, a cada brotar ou por do sol. Tudo está ruim e pode piorar, levam a Lei de Murphy como a mais sacrossanta das leis. Também desgosto daqueles que dizem tudo está bom, tudo é assim mesmo. Até nas tragédias, vêm logo com o chavão: “foi Deus quem quis assim”. Tudo se resume num fatalismo cruel, pois Deus é eleito como o carrasco mor, o causador ou, no mínimo, conivente com todas as dores e desgraças.
Dia destes, uma mulher que tivera vinte e um filhos e só vingaram cinco, resignada com a vontade de Deus naquele nordeste, onde os coronéis roubam ao sol do meio dia. Pior são aqueles do “ai no meu tempo”, “ai no tempo que eu era vereador, prefeito, juiz, deputado, general”. Como se a corrupção e as mazelas sociais fossem fruto do dia de ontem. Como se não tivéssemos gerações e gerações moldadas pela Lei de Gerson.
Talvez por isso que cada vez mais a descrença campeia, a desesperança virou consorte, de sorte que os que têm oportunidade se locupletam assim que podem. Tenho sido um inveterado otimista. Talvez por ter nascido num momento triste da vida nacional, em 1965. Vi e vivi muita coisa, apesar da pouca idade.
Vi o choque do petróleo, a quebradeira do Brasil, o surgimento da Aids (epâ, xô pessimismo). Pára ai, pois vi a Constituição cidadã, as diretas, a redemocratização, o Código do Consumidor, vi quase sumir um velho chavão: “sabe com quem você esta falando?”. Vi a universidade se espalhar, a tecnologia bater à porta, vi também a corrupção deslavada, mas vi muitos poderosos algemados.
Para aqueles saudosistas, que lembram da ditadura como o período da honestidade, nunca vi maior engodo. O problema è que nada se publicava. E me lembro de um velho comunista, meu professor, que me disse: “olha, cuidado com o ficar ‘achando’ isso ou aquilo, pois muitos amigos meus não foram achados ainda”. Sim, tenho esperanças e prego esperanças a todos, pois por estarmos no meio das chamas não percebemos os calores das mudanças.
Talvez eu creia demais, mas acredito que tudo pode ser melhor e que nada resiste ao trabalho. Que o sonho acordado é o melhor caminho, que o gesto de fraternidade com o Haiti me faz crer que a humanidade tem cura. Só depende de nós. Que percamos a desculpa de que não somos capazes de mudar o mundo, pois, se começarmos a mudar o nosso metro quadrado com certeza já estaremos fazendo nossa parte.
Luis Carlos Romazzini